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Brasil vive 'crescente degradação' dos oceanos e tendência é piorar, diz professor que participa de conferência ao lado de Lula v703d

Professor do Instituto Oceanográfico da USP faz críticas contundentes ao projeto de lei que altera as regras para o licenciamento ambiental no país: 'grande fragilização', diz 5s166s

9 jun 2025 - 15h22
(atualizado às 17h47)
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Raios e reflexos na água
Raios e reflexos na água
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participou na segunda-feira (9/6) da 3ª Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos (UNOC3) em Nice, na França. 1l6o54

Em pronunciamento no primeiro do dia, no plenário principal do evento, o brasileiro defendeu que não se permita "que ocorra com o mar o que aconteceu no comércio internacional", em referência à disputa tarifária iniciada pelo governo americano de Donald Trump.

"Evitar que os oceanos se tornem palco de disputas geopolíticas é uma tarefa urgente para a construção da paz", disse Lula, que anunciou comprometido de ratificar, ainda em 2025, o Tratado do Alto Mar, um acordo internacional que estende várias proteções ambientais aos oceanos.

Durante a UNOC3, há ainda a previsão que Brasil e França lancem uma iniciativa conjunta para encorajar outros países a incluírem iniciativas relacionadas ao oceano em suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs).

Mas em entrevista concedida antes da conferência, o professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP) e coordenador da Cátedra UNESCO para a Sustentabilidade do Oceano, Alexander Turra, fez críticas ao "grande e crescente estado de degradação" dos oceanos brasileiros.

"Temos tido picos, como jamais se viu no Brasil, de branqueamento dos corais, em decorrente do aquecimento do oceano. Temos cada vez mais processos erosivos em praias - dados de 2018 mostram que 40% das praias brasileiras estão em estado avançado de erosão", disse o biólogo e ecólogo em conversa com a BBC Brasil em 29 de maio.

"Estamos falando de uma situação realmente degradante."

Turra critica especialmente o atual projeto de lei que altera as regras para o licenciamento ambiental no país, aprovado no Senado no final de maio. Segundo ele, a mudança pode facilitar processos pouco planejados e danosos, entre eles exploração de petróleo em regiões sensíveis como a Bacia da Foz do Amazonas.

Um copo meio cheio? a5v5a

Turra é um dos representantes brasileiros da Academia na UNOC 3 e foi convidado para participar de um da conferência, além de outros muitos eventos laterais que ocorrem em Nice ao mesmo tempo.

Para o especialista, a participação das autoridades brasileiras em eventos internacionais é importante para mobilizar energias e recursos para a busca por soluções. Ele reconhece, porém, que "posicionamentos políticos" tendem a ver sempre o copo meio cheio quando essa nem sempre é a realidade.

"Quando um presidente coloca foco em um tema, o país inteiro, e toda a cadeia de comando, também am a prestar atenção. Isso é muito importante. Ainda que haja uma certa pirotecnia", diz.

Na prática, afirma, o atual governo tem feito uma boa moderação do tema, com a apresentação de proposta do Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA) para as zonas costeiras.

Para Turra, porém, o problema está na implementação e cumprimento das regras em nível local e no modelo de financiamento.

"A zona costeira é importante porque é ali que sentimos as mudanças do que acontece no oceano, por exemplo, a elevação do nível do mar, e os eventos extremos, que impactam também a atividade humana, como a pesca", diz.

"Mas, na prática, [ao invés de seguir as recomendações do PNA] o que vemos é o contrário, vemos os municípios flexibilizando e não combatendo a ocupação ou deixando de cumprir os planos."

"Embora haja alguns planejamentos, não há a implementação necessária e não tem especialmente dinheiro para fazer acontecer", completa.

O professor da USP defende uma mudança na lógica financeira em vigor, na qual, sem sua visão, o setor privado tem se colocado de forma "muito marginal e deslocada".

Turra critica ainda a falta de investimento e desenvolvimento nas áreas de pesquisa e monitoramento no país, onde segundo ele faltam dados para se avaliar com precisão o estágio de degradação das praias e oceanos.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participou nesta segunda-feira (9/6) da 3ª Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos (UNOC3) em Nice, na França
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participou nesta segunda-feira (9/6) da 3ª Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos (UNOC3) em Nice, na França
Foto: Foto: Ricardo Stuckert / Presidência da República / BBC News Brasil

'Não sabemos o que está acontecendo' 1e2666

O especialista afirma ainda que falta um "monitoramento sistemático" de eventos como poluição por esgoto urbano e lixo, erosão nas praias, aumento de marés vermelhas (fenômeno que provoca manchas de coloração escura na água do mar, provocadas pelo crescimento excessivo de algas microscópicas) e zonas mortas, áreas nos oceanos que apresentam um nível de oxigênio muito baixo, de forma que quase nenhuma espécie consegue sobreviver.

"Não estabelecemos esquemas de monitoramento consistentes para poder responder aos acordos que o Brasil assinou, como Agenda 2030 e o ODS 14.1", diz Alexander Turra. "O Brasil tem que apresentar relatórios de como está a situação do lixo no mar."

"A gente não tem séries temporais consistentes para poder falar o que está acontecendo."

Em seu discurso na Cúpula dos Oceanos em Nice, Lula tratou brevemente dos planos do país para o monitoramento.

"Vamos fortalecer a coleta de dados científicos por meio de um Sistema Integrado de Monitoramento e seguir investindo em pesquisa por meio da Estação Comandante Ferraz na Antártida", disse o presidente.

'A tendência é piorar' 3o3o1o

O professor do Instituto Oceanográfico da USP ainda faz críticas contundentes ao projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que cria uma Licença Ambiental Especial, com rito simplificado, para projetos considerados prioritários pelo Executivo.

Segundo Turra, trata-se de uma "grande fragilização" da lei que abre caminho para um agravamento da situação ambiental do país. "A tendência é só piorar", diz.

O texto foi aprovado no Senado em 21 de maio e é de autoria do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).

Por ter ado por mudanças no Senado, o texto agora volta será votado na Câmara. Caso seja aprovado pelos deputados, segue para sanção presidencial.

Ambientalistas criticam o projeto como a "a mãe de todas as boiadas", em referência a uma fala do deputado federal Ricardo Salles (Novo-SP) quando era ministro do Meio Ambiente do governo de Jair Bolsonaro (PL).

Segundo Alexander Turra, o PL pode, por exemplo, fragilizar o controle sobre projetos de mineração, levando a uma maior contaminação de rios e mares.

A bancada do agronegócio, uma das mais poderosas do Congresso Nacional, defende o projeto e o batizou como "destrava Brasil".

Os apoiadores da lei sustentam que ela vai manter e até ampliar a punição a crimes ambientais, reduzir a burocracia para a implementação de atividades econômicas e atrair investimentos.

Uma das mudanças propostas pelo projeto é a de que empreendimentos de médio porte e médio potencial poluidor possam estar sujeitos à Licença por Adesão e Compromisso (LAC), um tipo de licenciamento mais simples em que não há necessidade de apresentação ou realização de estudos de impacto ambiental.

Para que um empreendimento seja aprovado junto às autoridades, bastaria uma breve descrição do projeto com dados sobre a sua localização, dimensões e atividade que vai desenvolver.

Para Turra, tal procedimento equivale a uma "licença autodeclaratória". "Não dá para você colocar no ente privado o interesse ou a responsabilidade de defender os interesses difusos. Ele sempre vai defender os próprios interesses", diz.

"Temos uma grande responsabilidade em nossas mãos para ficar brincando de mudar regra sobre como tratamos a natureza. Estamos falando de água, de segurança hídrica, que impacta diretamente na economia e no agronegócio. Não consigo entender como o setor não percebe que eles dependem da água".

Segundo Turra, também pode ser danoso permitir ao governo federal acelerar o licenciamento de empreendimentos considerados estratégicos.

"Ainda vemos no país uma espécie de fetiche de vilanização da agenda ambiental, como se isso como se dela não dependesse todo o resto", diz.

À BBC News Brasil, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) disse que o projeto "representa desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema e representa risco à segurança ambiental e social no país".

Já a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não responderia às críticas feitas por ambientalistas e defendeu pontos do projeto, como o que determina que a consulta a indígenas e quilombolas durante o licenciamento só seria feita nos casos em que as terras em questão já estejam homologadas.

Durante sua viagem à França na última semana, o presidente Lula foi questionado se estaria disposto a barrar o projeto, e disse que é preciso aguardar o debate na Câmara.

"É muito difícil um presidente da república dar palpite de uma coisa que está sendo votada na Câmara", disse em uma coletiva de imprensa realizada em Paris.

"Os ministros do meu governo têm que ir para dentro da câmara debater. Tem que ir para dentro da Câmara debater. Porque se a gente estiver lá brigando, tem chance de fazer com que seja aprovado uma coisa melhor do que uma coisa pior."

Lula na França l6s41

Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante sessão de abertura da III Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos (UNOC 3). Port Lympia, Nice - França
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante sessão de abertura da III Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos (UNOC 3). Port Lympia, Nice - França
Foto: Ricardo Stuckert / Presidência da República / BBC News Brasil

Lula está na França desde 4 de junho. A primeira parada do presidente no país foi em Paris, onde foi recebido pelo presidente Emmanuel Macron para uma visita de Estado.

Além de encontros no Palácio do Eliseu, sede do governo francês, o chefe de Estado brasileiro teve em sua agenda um encontro com a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, uma homenagem da Academia de Letras, equivalente à Academia Brasileira de Letras, e a entrega de um diploma de doutor honoris causa pela Universidade Paris 8.

A participação de Lula na UNOC3 faz parte dos preparativos do Brasil para receber a 30ª edição da Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre Clima. A COP30 será realizada em novembro em Belém.

Em seu discurso na manhã desta segunda, o presidente convidou os representantes de todos os países presentes a participarem da COP e conhecerem a Amazônia. Lula também defendeu a inclusão da cultura oceânica nos programas escolares, como feito pelo Brasil.

Logo após sua fala em Nice, o presidente e sua delegação embarcaram para Lyon, para uma visita à sede da Interpol. A organização é atualmente comandada pelo brasileiro Valdecy Urquiza, delegado da Polícia Federal.

Está previsto anúncio de um acordo de cooperação para combate ao crime organizado.

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