Patrimônio Cultural Imaterial de Salvador desde 2018, samba junino enfrenta desafios de visibilidade e financiamento, apesar de sua relevância como base de grandes ritmos baianos e símbolo da cultura periférica.
Tem mais de meio século que festas em homenagem a santos católicos extrapolam os terreiros de candomblé da capital baiana e tomam as ruas no mês de junho. É o “samba junino”, Patrimônio Cultural Imaterial de Salvador, baseado em ritmos famosos como axé e timbalada, e que vive na luta para continuar sendo o “conservatório de música da periferia”. 6q5544
A expressão é de um “sambista junino” citado por Renata Viana Rodrigues, presidente da Liga do Samba Junino, que reúne 22 grupos. A artista foi criada entre os bairros periféricos de Liberdade e Boca do Rio, e reclama atenção do poder público e privado para o samba junino.
As apresentações são de graça, nas ruas, e o custeio dos grupos tem que ser resolvido nos corres, apertos e improvisos que as periferias conhecem bem. O samba junino acontece em locais como Pituaçu e Engenho Velho de Brotas, de onde vem Vagner Silva dos Santos, criador da definição de “conservatório de música da periferia”.
Na entrevista concedida ao Visão do Corre, a presidente da Liga do Samba Junino dá um panorama da festa para quem pretende curtir o São João – a propósito, pesquisa Terra Insights constatou que 44% dos entrevistados pretendem viajar ao Nordeste.
Querem ir a celebrações menores, como as de grupos de samba junino, muito distantes, física e conceitualmente, de muvucas monstras típicas de Salvador, como o Carnaval – onde, aliás, muita gente faz sucesso tendo bebido da fonte do samba junino.
Leia abaixo a entrevista com Renata Viana Rodrigues.
De onde vem o samba junino?
O samba junino vem justamente dos movimentos dos terreiros de candomblé, que festejam os santos católicos, São João, São Pedro. As festas eram enormes, não cabia tanta gente nos terreiros e transbordou para as ruas de Salvador.
Se surgiu nos terreiros, o samba junino é das periferias?
Nas festas juninas, os ricos vão para o interior, os pobres vão para as ruas de Salvador, tocando, ando de porta em porta, tomando um licor na casa do vizinho e fazendo a festa. Não tem uma data precisa de quando surgiu, mas tem mais de cinquenta anos.
Apesar da idade, é menos conhecido do que outros ritmos baianos.
O samba junino é um segmento do samba duro. Eu uso sempre uma frase de um amigo, ele diz que o samba junino é o conservatório da música da periferia. Deu origem a vários ritmos, inclusive axé music. Os músicos da timbalada iam com instrumentos de samba junino para o Candeal fazer ensaios. O Ilê Aiyê tem o samba junino na base.
Quais os principais instrumentos musicais do samba junino?
Timbal, daí o nome timbalada, além de tamborim e surdo, que são os principais. Usamos também cavaquinho, violão e trombone, além do xequerê, que é uma cabaça envolta por uma rede de contas.
Qual a agenda da festa?
O samba junino começa no Sábado de Aleluia, quando vários grupos dão início aos ensaios, que vão até 2 de julho, data da Independência da Bahia. Encerra nessa data. Nesse meio tempo, tem festival de samba junino em 29 de junho, com todos os grupos da Liga e outros.
Qual a principal dificuldade que vocês enfrentam?
Falta de incentivo. Muitas vezes o samba junino não consegue se inserir em editais que podem colocar grupos em circuitos importantes. Às vezes, abre brechas para outros segmentos participarem, com pessoas que muitas vezes acabam tirando a vaga de quem merece.
Tenho acompanhado vocês buscando apoios.
A gente está tentando furar a bolha, para que, de alguma forma, chegue a informação a outras pessoas, para que elas comecem a se manifestar, para que gente tenha um pouco de destaque. A gente tromba na burocracia, há pessoas não entendem o que é o samba junino, de extrema importância os bairros periféricos.
Vocês não têm sede física, alugada ou própria?
Não temos. Para você ter ideia, as reuniões são feitas em locais cedidos, a gente se encontra em vários lugares. Precisamos de lugares específicos, em bairros periféricos.