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Anúncios do governo americano sobre vacina contra covid alimentam desinformação nas redes 2cm4n

MUDANÇAS ANUNCIADAS PELA FDA NÃO SIGNIFICAM QUE FORAM DESCOBERTOS EFEITOS COLATERAIS NOVOS OU MAIS GRAVES QUE OS JÁ CONHECIDOS; ESPECIALISTAS ALERTAM QUE GRÁVIDAS DEVEM CONTINUAR A SE VACINAR m2o54

2 jun 2025 - 11h05
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Dois anúncios recentes sobre vacinas contra covid divulgados pela Food and Drug istration (FDA), a agência reguladora dos Estados Unidos, têm confundido usuários nas redes sociais. Diferentemente do que tem circulado, não houve descoberta de novos efeitos colaterais ou de eventos adversos mais graves. 1a3t3v

Foto: Estadão

As novas diretrizes também não significam que nunca houve necessidade de se vacinar contra o coronavírus. Pelo contrário: os dados científicos disponíveis mostram que as vacinas são seguras e salvaram milhões de vidas durante a pandemia.

O secretário de Saúde dos Estados Unidos, Robert F. Kennedy, Jr., anunciou o fim da necessidade de doses anuais de reforço da vacina contra covid para pessoas sem comorbidades entre 6 meses e 64 anos; ele também retirou mulheres grávidas saudáveis do esquema de vacinação recomendado pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC). Ao mesmo tempo, a FDA exigiu que as farmacêuticas Pfizer e Moderna ampliem o alerta já existente de miocardite e pericardite nas bulas das vacinas de mRNA.

Reconhecido ativista contra a imunização, Kennedy Jr. é fundador do grupo antivacina Children's Health Defense, que chegou a entrar com um processo na Justiça contra a FDA. A ação, que foi rejeitada no ano ado, contestava a autorização de emergência para as vacinas contra covid em dezembro de 2020, sob a alegação falsa de que elas eram "ineficazes e não aram por uma avaliação adequada".

Os especialistas ouvidos pelo Verifica apontam que deixar de recomendar a vacinação para crianças e adultos saudáveis poderia prejudicar a chamada "imunidade de rebanho" dos EUA. Quanto à decisão sobre mulheres grávidas, os estudiosos reforçam que elas fazem parte do grupo de risco da covid e devem continuar a se vacinar.

'Imunidade de rebanho' pode ser prejudicada

Os especialistas ouvidos pelo Verifica explicaram que de fato não há dados que justifiquem a necessidade de doses de reforço em crianças, jovens e adultos saudáveis. Mas, diante do histórico de Kennedy Jr., eles levantam a preocupação de que não seja mais recomendada a vacinação em geral, não apenas a imunização de reforço. A medida poderia enfraquecer a chamada imunidade de rebanho nos EUA.

O virologista Amílcar Tanuri explica que ainda não houve tempo hábil para estudos que demonstrem a necessidade de vacinação anual de reforço. O mesmo se aplica aos adultos saudáveis. Da mesma forma, não há dados que atestem não ser preciso a aplicação de doses periodicamente nesses grupos.

"Sabemos que os esquemas iniciais de vacinação oferecem boa proteção, mas também sabemos que a imunidade perde força ao longo do tempo", disse Tanuri, que coordena o Laboratório de Virologia Molecular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

O virologista Flávio Fonseca, do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que a decisão de manter a vacinação de reforço em determinados grupos populacionais é estratégica de cada país.

No caso dos EUA, diante do histórico antivacina do atual secretário de Saúde, ele aponta que existe um receio de que a decisão de não mais aplicar doses de reforço em crianças e adultos saudáveis possa abrir uma brecha para que a vacinação contra a covid-19 seja abolida nesses grupos.

"Se o reforço não vai ser anual, ela vai ser o que? Bianual, pentanual, ou nunca mais vai acontecer? Essa é uma dúvida que fica", disse Fonseca.

Tanuri acrescentou: "Se a gente começa a individualizar muito os públicos que arão a receber a vacina, começamos a perder a chamada imunidade de rebanho, o que aumenta os riscos para a população como um todo".

Fonseca reforça que os grupos mais suscetíveis às formas mais graves da covid podem ficar mais vulneráveis à medida que parcelas da população deixem de se vacinar.

"Vacinação é um pacto social. Ela tem um benefício individual, mas também coletivo", disse Fonseca. "Diminuindo a cobertura vacinal em segmentos da população, abre-se uma oportunidade para o vírus continuar circulando e consequentemente se espalhando para outros grupos mais susceptíveis às formas graves da doença".

Estudos mostram que grávidas devem tomar a vacina

Apesar do anúncio de Kennedy Jr., a lista do CDC continua incluindo gravidez como fator de risco para covid grave. O órgão lista oito estudos, entre 2020 e 2022, que apontam os riscos nessa população e apoiam a necessidade de vacinação. Há um outro mais recente, publicado este mês na revista BMC Medicine, que analisou casos do sudeste do Texas.

O estudo concluiu que a covid-19, tanto antes quanto durante a gravidez, foi identificada como um fator de risco para aborto espontâneo. "Esses achados destacam a importância da vacinação contra a covid-19 e do manejo pós-covid para gestantes e aquelas que planejam engravidar", conclui o estudo.

"Quando a grávida é vacinada, ela a os anticorpos contra a covid-19 para o bebê por meio da placenta. E essa a a ser a proteção da criança até os seis meses, quando ela se torna elegível para a vacina", disse Tanuri.

Como divulgado pelo jornal The New York Times, dados dos EUA mostram que, após o grupo de 75 anos ou mais, a faixa etária com maior risco de hospitalização é a de menores de 6 meses.

Fonseca explica que a mulher a por uma baixa do sistema imunológico durante a gravidez, o que reforça a importância da vacinação. "Esta é uma característica evolutiva dos mamíferos. E acontece justamente para que a mulher não rejeite o feto. Assim, se não for vacinada, ela se torna mais suscetível à infecção por covid", disse o virologista da UFMG.

Anúncio sobre crianças incentiva desinformação

O pronunciamento de Kennedy Jr. sobre vacinação em crianças causou confusão. Em um tuíte, ele afirmou que as crianças saudáveis foram removidas do esquema de vacinação recomendado pelo CDC. Mas em um vídeo, ele mencionou apenas o fim das doses de reforço anuais nesse grupo.

A falta de clareza impulsionou desinformação na redes sociais. No Brasil, um médico reconhecidamente antivacina escreveu que os que eram contra a vacinação em crianças sempre estiveram certos e que faltariam evidências clínicas para recomendar a vacina em crianças saudáveis. Mas tanto nos EUA quanto no Brasil isso não é verdade.

No Brasil, o boletim epidemiológico mais recente, divulgado em 13 de maio, mostra que 28 dos 47 menores de 1 ano que morreram por covid em 2024 não tinham comorbidades. Na faixa de 1 a 4 anos, 10 das 25 crianças que foram a óbito eram saudáveis.

Por outro lado, estudos mostraram a efetividade da proteção da vacina em crianças. Um dos exemplos é o artigo "Covid-19 vaccination in children: a public health priority" (Vacinação contra covid em crianças: uma prioridade de saúde pública), publicado no Jornal de Pediatria.

O estudo analisou dados obtidos no PubMed e em publicações do Ministério da Saúde e da Sociedade Brasileira de Pediatria entre janeiro de 2020 e novembro de 2022. Dentre as conclusões, consta que formulações pediátricas da vacina da Pfizer demonstraram significativa efetividade e segurança.

Nos EUA, dados do CDC de julho de 2023 a março de 2024 mostraram que metade das crianças hospitalizadas por covid não tinham nenhuma comorbidade. Entre 183 mortes pediátricas por covid de 2020 a 2022, uma revisão dos dados publicada pela Academia Americana de Pediatria constatou que 32% das crianças que morreram não tinham outra condição médica.

Outros dados do órgão atestaram que duas ou mais doses de vacinas contra a covid foram 40% eficazes em prevenir visitas ao pronto-socorro e hospitalizações entre crianças menores de 5 anos. As estatísticas foram referidas em matéria do New York Times.

Até esta segunda-feira, 2, o site do CDC continua recomendando a vacina covid para todos acima de 6 meses de idade.

Restrição em doses de reforço não cita efeito colaterais

Nesta semana, diretores do FDA publicaram um comentário no The New England Journal Of Medicine (NEJM) afirmando que as doses de reforço da vacina contra covid nos EUA arão a ser recomendadas somente para pessoas de 65 anos ou mais e para todas aquelas com mais de 6 meses que tenham um ou mais fatores de risco para covid grave. A lista de fatores de risco é a do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

Cartas da FDA à Pfizer e Moderna, tornadas públicas no dia 21, determinaram uma ampliação nas bulas dos alertas de miocardite e pericardite — que já constavam nos rótulos.

Nas redes sociais, as duas ações foram repercutidas em postagens enganosas. Elas dão a entender que os anúncios do FDA estão relacionados a novos efeitos colaterais dos imunizantes ou a descobertas que apontariam para uma maior gravidade desses eventos em comparação com o que já se sabia. Nada disso é verdade.

O texto dos diretores da FDA não cita efeito colaterais. Eles apontam que é incerto o benefício de repetidas doses da vacina contra a covid-19 entre pessoas de baixo risco que podem ter recebido múltiplas doses do imunizante, tido múltiplas infecções por covid-19, ou ambos os casos.

"Simplesmente não sabemos se uma mulher saudável de 52 anos que teve covid-19 três vezes e recebeu seis doses anteriores de uma vacina contra covid-19 se beneficiará da sétima dose", dizem os autores.

Para pessoas saudáveis, sem fatores de risco, entre 6 meses e 64 anos, a FDA exigirá novos ensaios clínicos que atestem a eficácia de doses de reforço nessa população.

Atualização na bula das vacinas não traz dados novos

As cartas à Pfizer e à Moderna determinaram ampliação nas bulas dos alertas de miocardite e pericardite que já constavam nos rótulos. Segundo os infectologistas Renato Kfouri e Julio Croda, o novo texto recomendado pela agência não traz novidades em relação ao que já se sabia sobre a incidência desses eventos raros.

A miocardite é a inflamação do miocárdio, tecido muscular do coração. Já a pericardite é a inflamação do pericárdio, membrana que envolve o coração. Segundo o CDC, os casos relacionados com a vacinação são raros e a maioria dos pacientes se recupera rapidamente após medicação e repouso.

Nas cartas às empresas, a FDA menciona dados de sistemas de vigilância após a aplicação das fórmulas 2023-2034 das vacinas de mRNA e de um estudo do ano ado que analisou informações de pacientes nos EUA.

A FDA determina que, nas bulas, os trechos que citam maior risco em homens dos 12 aos 17 anos (Pfizer) e em homens de 18 a 24 anos (Moderna) sejam substituídos pela faixa etária dos 16 aos 25 anos.

Outra alteração é a inclusão da incidência, que pode ocorrer no período de um a sete dias após a vacinação, de oito casos por milhão de doses em pessoas de 6 meses a 64 anos de idade, e de 38 casos por milhão de doses em homens de 16 a 25 anos.

Uma página do CDC, com atualização em 31 de janeiro, informa que resultados de pesquisas sobre efeitos da miocardite pós-vacinação a longo prazo devem estar disponíveis em breve.

"O que se tem de mudança nas bulas é uma recomendação mais abrangente de idade, o que eu acho correto. Mas os dados de incidência de miocardite e pericardite já eram conhecidos", disse Julio Croda, infectologista da Fiocruz e professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).

Kfouri, que é presidente do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), explica que a alteração em bula de vacinas é normal de acordo com os dados de vigilância após licenciamento. Em relação à incidência dos casos, ele também afirma não haver novidade. "São dados que a gente já conhece", disse.

O pediatra infectologista acrescenta que a miocardite por aplicação da vacina contra a covid-19 é menos grave do que a miocardite causada pela própria covid-19 ou por outros vírus. Ele baseia a afirmação em um estudo publicado, em agosto do ano ado, no periódico científico Journal of the American Medical Association (JAMA).

O estudo analisou 4.635 pacientes hospitalizados por miocardite na França durante um ano e meio após a vacinação contra covid-19. A pesquisa concluiu que os 558 indivíduos com miocardite pós-vacina tiveram eventos cardiovasculares menos graves do que aqueles com miocardite resultante da infecção por covid ou com outras origens após 18 meses de acompanhamento. Os pacientes afetados, principalmente homens jovens saudáveis, podem requerer cuidado médico por até vários meses após a alta hospitalar.

Esquema vacinal no Brasil

No Brasil, diretrizes atualizadas no fim do ano ado incluíram a vacina contra a covid-19 no Calendário Nacional de Vacinação para crianças de 6 meses a 5 anos, com esquema de três doses da Comirnaty (Pfizer) ou duas doses da Spikevax (Moderna).

O Ministério da Saúde recomenda uma dose de reforço a cada seis meses para idosos acima de 60 anos e para imunocomprometidos a partir de 5 anos. Pessoas com comorbidades entre 5 e 59 anos devem receber um reforço anual. Para gestantes, a orientação é uma dose da vacina a cada gestação em qualquer tempo do pré-natal.

"No Brasil, a gente segue vacinando as crianças, que continuam apresentando altas taxas de hospitalização por 100 mil habitantes, até mesmo superiores a dos idosos", disse Kfouri. "Vamos continuar vacinando crianças e idosos até o fim da vida? Não sabemos. Vai depender do momento, de acordo com os dados epidemiológicos".

Estadão
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